quinta-feira, 12 de março de 2009

Invasão Jamaica: O Dancehall está acabando com o Reggae ?

11/03/2009 - 03:21

Engana-se quem pensa que na Jamaica o Reggae está em toda esquina. A ilha sempre foi conhecida por sua boa música. Independente se você gosta de Reggae ou não, mas sim se você gosta de bons instrumentistas.
O problema é que a grande marca da cultura Jamaicana deixou há tempos de ser feita e apreciada pelas massas, que a trocaram por um tipo de musica com poucos instrumentais e letras carregadas de promiscuidade, homofobia entre outros aspectos. Esse gênero é chamado de Dancehall.
Essa semana foi publicada uma matéria no Jornal Jamaica Gleaner sobre uma reunião realizada em Nova Iorque, na última quarta-feira, a fim de encontrarem uma solução para esses problemas.

Dancehall

Anúncio do Encontro

O debate acalorado contou com a presença estimada de 200 pessoas, entre jornalistas, músicos e produtores no Billy Holiday Theatre. Foi organizado pela "CPR - Coalização para a preservação do reggae (Coalition to Preserve Reggae) e esteve focado no banimento das letras libidinosas nas rádios Jamaicanas. Terminando com a conclusão de que:

"O dancehall é um gênero propenso a colocar os jovens jamaicanos em extinção". A autora da polêmica frase foi Sharon Gordon.

Sharon Gordon

Sharon Gordon, (Coalition to Preserve Reggae)

"Corrompendo a mente dos jovens"

“Se algo não for feito logo, a mente dos nossos jovens será corrompida pela decadência e seus atos serão reflexo da mesma. ... nossos jovens estão em perigo de estarem em um ponto sem retorno ... levando-nos a uma sociedade retardada no futuro”, foi a forte mensagem de Sharon Gordon da CPR e Carlyle McKetty.

Eles se colocaram de frente a um impressionante painel de jornalistas, músicos, produtores, psicólogos, palestrantes e ativistas, afirmando a posição do grupo de que o dancehall é só mais uma das doenças que ameaçam a juventude jamaicana. As outras incluem falta de oportunidades de emprego, educação pobre e divisão social.

“Isso coloca a responsabilidade somente nas mãos das autoridades, que devem resolver as deficiências sociais, econômicas e educacionais que terão, por sua vez, um efeito positivo do gênero”, ressaltou Gordon.

Sharon & Carlyle

Sharon e Carlyle McKetty

O psicólogo Dr. Leahcim Semaj apoiou essa visão de que as letras de músicas populares tem a habilidade de influenciar atitudes.

“Basta olhar para os anos 70 com Bob Marley o número de jamaicanos que se tornaram Rastas e Afrocêntricos “, disse Semaj.

O Dancehall está em séria discussão na Jamaica desde que a atenção foi voltada para as letras de artistas como Mr. Vegas, Vybz Kartel e Capleton. O debate desde então foi discutido pelo mundo, recebendo opiniões diversas.

“Eu dúvido que alguém discutiria a prevalência de letras libidinosas e violentas nas músicas”, disse a Cônsul Geral da Jamaica em Nova York, Geneive Brown Metzger, enquanto se dirigia para a platéia.

“Eu, pessoalmente, apoio as recentes iniciativas pelo governo de limitar dizendo o que é o bastante para esses artistas, produtores e os meios de divulgação como as rádios, que tem colaborado em levar a música e a cultura popular para infâmia” ela concluiu.

Ressaltando o fato de que a cultura musical da ilha, assim como os esportes do país, são a espinha dorsal da “Marca Jamaicana”, o debate foi visto como de extrema importância e estava mandando uma mensagem muito importante de que é necessário discussão no assunto. Como Brown Metzger, Sheron Hamilton-Pearson a presidente do People of Black Heritage, sente que chegou a hora de aumentar o nível na música.


Denegrindo a “Marca Jamaicana”


“A música definitivamente tem a ver com a “Marca Jamaica” estar se denegrindo. Sabemos dos problemas da chamada “murder music” (letras homofóbicas), que são apoiadas não só pelos artistas, como pelos ouvintes”, reclamou a antiga membro dos Panteras Negras Britânicos. De acordo com ela, quando os artistas ficam sabendo que os shows serão cancelados, ficam mais cautelosos.

“Artistas como Sizzla dizem uma coisa na Jamaica, mas fazem outra em outros lugares. Ele manera suas letras, pois entende que isso poderia acabar com sua carreira”, disse Hamilton-Pearson.

Um dos defensores do dancehall, o produtor Jon “FX” Crawford, que produziu sucessos como Shabba Ranks, Vybz Kartel, Akon e Sizzla, defende:

“o dancehall nunca acabara com o reggae ou a marca da nossa cultura”.Ele disse que o problema é o som do Dancehall atual, computadorizado, “O dia que começarmos a voltar a tocar instrumentos em nossas escolas ou comunidades, teremos uma vasta diferença, pois nossas gerações mais jovens saberão como a música é feita de fato.”

Dr. Semaj fez um paralelo entre a degradação da música com a crise da economia global. “A falta de fiscalização ativa permitiu que um péssimo recurso fosse rotulado como bom, levando a quebra do sistema”, opinou.

“O fato da música ser tocada na rádio, automaticamente dá a licença para ser cantada por qualquer um. A imagem que nossos jovens recebem é a que vão internalizar seus valores transformados pela música.

Satisfeitas com o discurso, Gordon e McKetty disseram que o fórum vai advogar a CPR, que tem o alvo em aumentar o nível das produções e performances da música jamaicana.

“A CPR vai continuar nos seus esforços de angariar informações sobre o estado da música e desenvolver estratégias para afetar seu desenvolvimento”, disse Gordon.

Enquanto isso acompanharemos o andamento. E torcemos para que seja recuperada a velha e boa música Jamaicana.

Dancehall_Baile

Dancehall

Dancehall

Cenas comuns nos bailes de Dancehall Jamaicanos

De cordeira de bloco Carnavalesco a Assistente Social: Uma trajetória.

Por Márcio Viana (Subwoofer)*

Quem vê esse sorriso bonito, logo pensará que este é só um sorriso de uma "beleza negra". Só que por traz dessa formosura há uma história sofrida, de muita luta e conquista. A Assistente Social, Carla Akotirene, nascida no bairro da Liberdade, na Avenida Peixe, filha da sacoleira Célia, já foi vitima de abuso sexual na infância; racismo e preconceito social, como muitas mulheres pretas no Brasil.

Os crimes de violência contra mulher, preconceito e racismo; a desigualdade social, a fome, o desejo de lutar por novos ideais de vida foram uma das motivações que fizeram a ex-cordeira de bloco carnavalesco, Carla Akotirene, sustentar o sonho de se tornar Assistente Social. Quem há conhece sabe da sua espiritualidade, otimismo, força e vontade de ver suas irmãs e irmãos pretas/os num processo de formação profissional, livre do cárcere do Estado e de todo e qualquer tipo de violência que sofre o povo brasileiro. Mulher preta, assim se define assumindo seu orgulho Black após sua passagem pelo Instituto Cultural Steve Biko, onde passou pelo processo de formação educacional e político.

Segundo Carla, é preciso potencializar as ações do movimento negro nas comunidades, escolas e presídios para que a população perceba a trama orquestrada pelo Estado brasileiro que visa manter a exclusão racial, geracional, de gênero, dentre outras opressões proveniente do sistema machista, sexista, e opressor direcionado ao povo Preto. E desta forma incentivar os projetos pessoais e coletivos das/os descendentes de africanas/os para que sejam concretizados, contrário ao extermínio físico, cognitivo e espiritual que engendrou o conflito nas relações raciais no país.

Akotirene, hoje, faz parte do grupo de mulheres conscientes, militante feminista, é conselheira municipal do Conselho da Comunidade Negra do Salvador, coordenadora do Fórum Baiano de Juventude Negra e coordenadora do Centro de Promoção da Igualdade da Bahia, centro, este que abriga o Conselho Estadual da Comunidade Negra e o Conselho em Defesa dos Direito da Mulher. Carla deste modo busca contrariar os dados da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (DEAM), com endereço no final de linha do Engenho Velho de Brotas, que até o mês de fevereiro, do ano corrente, registrou 07 casos de estupro; 28 prisões em fragrante; 84 casos de agressão moral; 433 casos de ameaças; 448 casos de lesão corporal; 1332 ocorrências policiais; 129 inquéritos instaurados e 97 remetidos.

Segundo a Delegada titular da DEAM, Celi Carlos, após a criação da Lei Nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, Lei Maria da Penha, houve um aumento de denuncia de violência domestica e familiar contra a mulher. Cada mulher é ouvida com a presença de testemunha e o agressor, após o inquérito instaurado, fica a disposição da justiça.

No mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, dia 8 de março, a delegacia funciona normalmente com palestras educativas e de orientação. Já no domingo (8) a DEAM participa do conjunto de atividades de lazer, arte e entretenimento, no Dique do Tororó, Salvador. Os servidores da delegacia estarão distribuindo panfletos educativos e passando orientações sobre os serviços oferecidos ao público, principalmente o Disque Denúncia.

Sendo assim, através da coragem de lutar por respeito, valor social e moral, melhores condições de trabalho, uma vida sem violência e denunciando seus agressores, luta diária, que o destino de mulheres guerreira, como Carla, Celi, Ana, Paula, Dandara, Luiza, tem alcançado os resultados desejados. Preservando a perspectiva de mudança.

*Neto de Marieta e filho de Cleonice, mulheres pretas; Radialista, Estudante de Letras, Educador.
Contato - negroneves@gmail.com
Todos os sabados na Rádio Educadora FM 107.5, Programa "No Balanço do Reggae", das 16 às 17h. http://www.irdeb.ba.gov.br
Visite meu blog:
http://avozdaraca.blogspot.com

Notícia: http://www.irohin.org.br/onl/new.php?sec=news&id=4237

terça-feira, 10 de março de 2009

Feminicídio no Congo


Submitted by t on Ter, 13/11/2007 - 08:10.
Dramaturga e ativista descreve ao Conselho de Segurança da ONU os crimes e atrocidades contra mulheres no Congo.
Por Eve Ensler
Volto do inferno. Procuro desesperadamente uma maneira para lhes contar o que vi e ouvi na República Democrática do Congo. Procuro uma maneira para lhes narrar as histórias e as atrocidades, e, ao mesmo tempo, evitar que fiquem abatidos, chocados ou afetados mentalmente. Procuro uma maneira de lhes transmitir o meu testemunho sem gritar, sem me imolar ou sem procurar uma AK 47.
Não sou a primeira pessoa que denuncia as violações, as mutilações e as desfigurações das mulheres do Congo. Existem relatórios a respeito deste problema desde 2000. Não sou a primeira que conta essas histórias, mas, como escritora e militante contra a violência sexual contra as mulheres, vivo no mundo da violação. Passei dez anos a ouvir as histórias de mulheres violadas, torturadas, queimadas e mutiladas na Bósnia, Kosovo, Estados Unidos, Cidade Juárez (México), Quênia, Paquistão, Haiti, Filipinas, Iraque e Afeganistão. E, apesar de saber que é perigoso comparar atrocidades e sofrimentos, nada do que eu tinha escutado até agora foi tão horrível e aterrorizador como a destruição da espécie feminina no Congo.
A situação não é mais do que um feminicídio, e temos que a reconhecer e analisar como tal. É um estado de emergência. As mulheres são violadas e assassinadas a toda hora. Os crimes contra o corpo da mulher já são horríveis por si. No entanto, há que acrescentar o seguinte: por causa de uma superstição que diz que, se um homem viola mulheres muito jovens ou muito idosas, obtém poderes especiais, meninas de menos de doze anos de idade e mulheres de mais de oitenta anos são vítimas de violação.
Também é necessário acrescentar as violações das mulheres em frente de seus maridos e filhos. Mas a maior crueldade é a seguinte: soldados soropositivos organizam comandos nas aldeias para violar as mulheres, mutilá-las. Há relatos de centenas de casos de fístulas na vagina e no reto causadas pela introdução de paus, armas ou violações coletivas. Essas mulheres já não conseguem controlar a urina ou as fezes. Depois de serem violadas, as mulheres são também abandonadas por sua família e sua comunidade.
No entanto, o crime mais terrível é a passividade da comunidade internacional, das instituições governamentais, dos meios de comunicação... a indiferença total do mundo perante tal extermínio. Passei duas semanas em Bukavu e Goma entrevistando as sobreviventes. Algumas eram de Bunia. Efetuei pelo menos oito horas de entrevistas por dia. Almocei e fui a sessões de terapia com essas mulheres. Chorei com elas. O nível de atrocidades supera a imaginação. Não tinha visto em nenhuma parte esse tipo de violência, de tortura sexual, de crueldade e de barbárie.
No leste do Congo existe um clima de violência. Nesta zona as violações tornaram-se, tal como me disse uma sobrevivente, um ?esporte nacional?. As mulheres são menos do que cidadãs de segunda classe. Os animais são mais bem tratados. Parece que todas as tropas estão implicadas nas violações: as FLDR, as Interahamwe, o exército congolês e até as Forças de Paz da ONU. A falta de prevenção, de proteção e a ausência de sanções são alarmantes.
Passei uma semana no Hospital de Panzi, vivendo em uma aldeia de mulheres violadas e torturadas. Era como uma cena de um filme de terror futurista. Ouvi histórias de mulheres que viram os seus filhos serem brutal e cinicamente assassinados. Mulheres que foram forçadas, sob a ameaça de armas, a ingerir excrementos, a beber urina ou a comer bebês mortos. Mulheres que foram testemunhas da mutilação genital dos seus maridos ou, durante semanas, violadas por grupos de homens. Essas mulheres faziam fila para me contar as suas histórias. Os traumas eram enormes e o sofrimento extremamente profundo.
Sentei-me com mulheres que tinham sido cruelmente abandonadas por suas famílias, excluídas por causa do seu cheiro, e pelo que tinham sofrido. Eu quero lhes falar da Noella. Mudei-lhe o nome para a proteger porque ela só tem nove anos de idade. Noella vive dentro de mim agora, persegue-me, leva-me a agir, a lembrar. Ela é magra, muito inteligente e viva. O dano está no seu corpo ligeiramente torto, envergonhado, preocupado. Ela sente a ansiedade nos seus pequenos dedos. Começa a contar a sua história como se ainda vivesse. Para ela o tempo parou.
?Uma noite as Interahamwe vieram à nossa casa. Eles não deixaram nada. Pilharam nossa casa. Levaram a minha mãe para um lado, o meu pai para outro e a mim para outro. Levaram-me para o mato. Um deles pôs qualquer coisa dentro de mim. Não sei o que foi. Um disse para o outro, não faça isso, não faça mal a uma criança. O outro me bateu. Eu fiquei sangrando. Ele me bateu mais e eu caí. Depois me abandonou. Passei duas semanas com os soldados. Eles me violaram constantemente. Às vezes usavam paus. Um dia me deixaram no mato. Tentei caminhar até a casa do meu tio. Consegui, mas estava demasiado fraca. Tinha febre. Estava muito mal. Cheguei até a casa. O meu pai tinha sido morto. A minha mãe voltou, mas em muito mau estado. Comecei a perder a urina e as fezes sem controle. Depois minha mãe percebeu que eles tinham me violado e destruído. Eles registraram o que tinha me acontecido e me trouxeram para cá. Estou contente por estar aqui. Já não perco a urina e ninguém ri de mim. Os rapazes riem de mim. Já não tenho vergonha. Deus julgará aqueles homens, porque eles não sabem o que fazem. Quero me restabelecer. Também penso em como eles mataram o meu pai. Sempre que penso no meu pai as lágrimas caem pelo rosto.?
O Dr. Mukwege, que, tanto quanto posso dizer, é um tipo de médico ?santo? no hospital, disse-me que a uretra da Noella está destruída. Sendo tão jovem, ela não tem tecido suficiente para operar. Terá de esperar oito anos. Oito anos de vergonha e humilhação. Oito anos em que será forçada a recordar todos os dias o que aqueles homens lhe fizeram na floresta, antes dela ter idade suficiente para saber o que era um pênis. Ela é incontinente. O médico me disse: ?O que acontece a essas jovens é terrível. Elas têm muito medo de serem tocadas por homens. Às vezes leva semanas até eu conseguir tratá-las. Dou-lhes bombons e trago-lhes bonecas.?
As mulheres sofrem imensamente. Estão debilitadas pelas violações, as torturas e a brutalidade. Não têm praticamente apoio nenhum. Depois de viver essas atrocidades, são incapazes de trabalhar nos campos ou de transportar coisas pesadas, por isso deixam de ter renda. Vi chegar pelo menos doze mulheres por dia a essa aldeia. Chegavam mancando e apoiadas em bengalas feitas à mão. Várias mulheres contaram-me que ?as florestas cheiravam à morte?, e que ?não se podia dar nem cinco passos sem tropeçar com um corpo?.
Durante a semana que passei em Panzi, o governo cortou a água. Por isso, o hospital, onde havia centenas de mulheres feridas, ficou sem água. O mesmo hospital pelo qual as mulheres tinham andado mais de sessenta quilômetros porque não havia outro mais perto. O mesmo hospital onde não havia nada para comer, (duas crianças morreram por má nutrição em um dia), onde as mulheres tinham de ficar durante meses, às vezes anos, porque as suas aldeias eram tão perigosas ou porque eram tão rejeitadas, após terem sido violadas e desonradas, que não tinham um lugar para onde voltar, onde as mulheres não podiam apresentar queixa porque os violadores podiam facilmente comprar a sua saída da prisão, voltar e violá-las outra vez, ou matá-las.
E, enquanto nós estamos aqui escrevendo nosso relatório, há mulheres que estão sendo violadas, meninas que estão sendo destroçadas para sempre, mulheres sendo testemunhas do assassinato (a golpe de catana) de suas famílias, e outras que estão sendo infectadas pelo vírus da AIDS. Onde está a nossa indignação? Onde está a consciência das pessoas?
Em 1999, eu voltei aos Estados Unidos de uma viagem ao Afeganistão, ainda debaixo do poder dos talibãs. As condições das mulheres, a violência... era uma loucura. Dirigi-me a todas as pessoas que consegui encontrar, canais de televisão, revistas, líderes etc. Com exceção de uma revista, ninguém parecia estar interessado no problema das mulheres afegãs.
Naquela altura eu sabia que, se não se interviesse, se o mundo não se levantasse e ajudasse as mulheres, haveria graves conseqüências internacionais. Sabemos o que aconteceu depois. Não apenas o 11 de Setembro, mas a reação ao 11 de Setembro, a profanação do Iraque, a justificação dos ataques preventivos, o aumento da militarização e violência e o terror que ainda hoje continua a aumentar.
As mulheres são o centro de qualquer cultura e sociedade. Embora possam não ter poder ou direitos, o modo como são tratadas ou não valorizadas, indica o que a sociedade sente em relação à própria vida. As mulheres do Congo são resistentes, poderosas, visionárias e solidárias. Com poucos recursos elas poderiam ser líderes do país e tirá-lo do seu atual estado de desordem, pobreza e caos; ou podem ser aniquiladas e, com elas, o futuro do país. A República Democrática do Congo é o coração da África, o centro dinâmico e a promessa do futuro. Se se permitir a destruição das mulheres, mata-se a vida, não apenas do Congo, mas de todo o continente africano.
Eu estou aqui como artista e ativista, mas, sobretudo, estou aqui como um ser humano destroçado pelo que ouvi na República Democrática do Congo. Estou aqui para implorar àqueles que têm poder, para declarar estado de emergência no leste do Congo, para dar um nome ao que está sendo feito às mulheres: feminicídio. Para se unirem à nossa campanha internacional para parar as violações do melhor recurso do Congo, e dar poder às mulheres e jovens do Congo. Para desenvolver os mecanismos para proteger essas mulheres, para impedir esses crimes horrorosos e desumanos.
Recomendações para terminar com a violência contra as mulheres e jovens na República do Congo
A impunidade da violência sexual tem que terminar. Apesar de centenas de milhares de mulheres e jovens violadas, não houve, praticamente, nenhuma acusação. Incumbe a toda a comunidade internacional fortalecer mecanismos na República Democrática do Congo para assegurar que os violadores serão levados à Justiça, e as vítimas protegidas, através de ações judiciais. (Mais mulheres juízas, assim como mais mulheres na polícia e advogadas são essenciais para que isso aconteça).
Está previsto que membros do Conselho de Segurança vão à República Democrática do Congo na próxima semana. É importante que eles:
a) Falem com o Governo seriamente sobre o assunto da violência sexual. Devem abordar esse tema com o presidente, e perguntar, especificamente, o que ele está fazendo para assegurar que os militares (que são os que mais cometem esses crimes) não cometam crimes de violência sexual, e que os comandantes sejam responsabilizados pelas ações dos seus soldados, e que os soldados sejam também levados à Justiça.
b) Ao reunirem-se com o Parlamento e as autoridades eleitas, os membros do Conselho de Segurança devem insistir para que seja estabelecida uma comissão parlamentar sobre a violência sexual. Devem também apelar para que se inicie um debate público com o ministro da Defesa sobre esse tema.
c) A Missão das Nações Unidas na República Democrática do Congo (MONUC) deveria estabelecer uma unidade de combate contra a violência sexual, incluindo pessoal militar e civil, para dar prioridade à ?resposta dada às sobreviventes de violência sexual e à proteção de mulheres e crianças, sobretudo em Goma e Bakuvu?. Os países que contribuem com tropas também têm que ter um papel mais ativo, enviando mulheres como soldados da paz.
d) Os estados membros e as Nações Unidas devem mostrar o seu compromisso para terminar com a violência contra as mulheres da República Democrática do Congo através da atribuição de recursos financeiros significantes. Existem alguns bons projetos, por exemplo, o Hospital de Panzi, mas isso é muito pouco quando consideramos as enormes necessidades e a magnitude da violência. São necessários mais recursos, que poderiam ser usados para apoiar, por exemplo, programas de rádio/televisã o realizados por mulheres sobre os direitos das mulheres, violência contra as mulheres, e outros temas importantes que precisam ser abordados para romper o silêncio sobre a violência sexual.
e) Os membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas devem pedir ao secretário-geral que providencie um relatório sobre a situação da violência sexual na República Democrática do Congo. Esse relatório deve ser recebido pelo Conselho em tempo oportuno (três meses).
17/10/2007
Texto original divulgado em 15/06/2007
Este artigo foi traduzido do inglês para o português por Cristina Santos, membro de Tlaxcala, a rede de tradutores pela diversidade lingüística, e revisada para ViaPolítica por Omar L. de Barros Filho. Ambas versões podem ser reproduzidas livremente, na condição de que sua integridade seja respeitada, bem como a menção ao autor, aos tradutores, aos revisores e à fonte.